Porque não tem cientista no Brasil?
Spoiler: porque não pagam nada.
Evolução Histórica das Bolsas no Brasil (1995–2024)
Gráfico 1: Valores Reais (corrigidos para 2024).
O gráfico acima exibe os valores anuais das bolsas de Iniciação Científica (IC), Mestrado e Doutorado em reais (ajustados pela inflação medida pelo IPCA). Nota-se uma acentuada queda do poder de compra das bolsas desde 1995 até meados dos anos 2000. Durante o período de 1995 a 2002 (governo FHC), não houve reajuste nominal das bolsas, fazendo-as perder aproximadamente metade do valor real. Mesmo com alguns reajustes pontuais nos anos 2004, 2006, 2008 e 2012/2013, as bolsas nunca recuperaram o patamar de meados dos anos 90 em termos reais. No gráfico, isso se reflete na tendência descendente de todas as categorias: o valor real das bolsas de Doutorado (linha vermelha) despencou de cerca de R$ 7 mil (em valores de 2024) em 1995 para menos de R$ 3 mil por volta de 2015; as bolsas de Mestrado (laranja) caíram de cerca de R$ 5 mil para próximo de R$ 2 mil no mesmo intervalo; e a IC (amarela) reduziu-se de aproximadamente R$ 1,6 mil para menos de R$ 500. Apenas em 2023 observa-se uma inflexão para cima nas três curvas, reflexo de um reajuste significativo (~40%) naquele ano. Contudo, mesmo com esse aumento recente, o valor real atual das bolsas permanece muito abaixo do que era nos anos 90, evidenciando a desvalorização acumulada ao longo de quase três décadas.
Gráfico 2: Valores Nominais Anuais.
Este gráfico apresenta os valores efetivamente pagos em cada ano (sem correção inflacionária) para bolsas de IC, Mestrado e Doutorado. Fica evidente o caráter discreto e esporádico dos reajustes, com longos períodos de congelamento seguidos por aumentos bruscos. De 1995 até 2003, as bolsas mantiveram-se fixas (por exemplo, ~R$ 724 no mestrado e R$ 1.073 no doutorado durante todo esse período). A partir de 2004, ocorreram reajustes em poucos anos específicos: 2004, 2006, 2008 e depois somente 2012/2013. Cada patamar permanece estático por vários anos, resultando nas “escadas” no gráfico. Por exemplo, a bolsa de doutorado subiu de R$ 1.072 para R$ 1.267 em 2004, depois para R$ 1.394 em 2006, R$ 1.800 em 2008, e finalmente R$ 2.200 em 2013 – permanecendo congelada nesse valor por 9 anos até o reajuste de 2023. Observa-se comportamento similar para o mestrado (de R$ 724 em 2003 para R$ 1.500 em 2013) e IC (de R$ 241 em 2003 para R$ 400 em 2013). Esses dados confirmam que apenas quatro grandes reajustes foram concedidos entre 1995 e 2022, todos insuficientes para repor plenamente a inflação. O último aumento, implementado em 2023, elevou as bolsas de mestrado para R$ 2.100 e doutorado para R$ 3.100 (IC de R$ 400 para R$ 700), patamares atuais que corrigem parcialmente a defasagem acumulada.
Gráfico 3: Bolsas vs. Salário Mínimo.
Neste gráfico, compara-se o valor das bolsas como porcentagem do salário mínimo de cada ano. Em 1995, uma bolsa de doutorado equivalia a cerca de 10 vezes o salário mínimo da época – no gráfico, ~1000%. Já a bolsa de mestrado valia em torno de 7,2 salários mínimos (~720%), e a de IC pouco mais que 2 salários mínimos. Ao longo dos anos, vê-se uma queda contínua dessa relação. Na década de 2000, as bolsas de pós-graduação passaram a representar entre 3 e 5 salários mínimos, e atualmente a bolsa de doutorado equivale a apenas cerca de 2,2 salários mínimos, e a de mestrado em torno de 1,5. A bolsa de IC, que nos anos 90 superava o valor do mínimo, hoje corresponde a aproximadamente metade do salário mínimo. Essa drástica redução da proporção indica forte perda do poder de compra relativo dos bolsistas. Por exemplo, em 1995 a bolsa de mestrado permitia uma manutenção próxima à de um salário mínimo necessário (cálculo do DIEESE) para sustentar uma família, enquanto hoje corresponde a menos da metade desse mínimo necessário. Em suma, as bolsas não acompanharam o crescimento do salário mínimo nacional, passando de valores relativamente confortáveis nos anos 90 (10 salários no doutorado) para níveis de mera subsistência na atualidade (inferiores a 2 salários). Isso evidencia a desvalorização relativa enfrentada pelos pesquisadores em formação no Brasil.
Comparando com valores atuais em termos de paridade com o Salário Mínimo de 2025 (R$1525) as bolsas deveriam ser de:
- Doutorado: R$15250
- Mestrado: R$10980
- IC: R$3050
O que explica, em grande parte, o apagão de ciência no Brasil e mostra como, independentemente do governo (mas muito mais nos governo FHC e Bolsonaro) a ciência não é prioridade.